O debate que foi suscitado acerca do manifesto que defende a reestruturação da dívida pública portuguesa vem provar que há quem apenas procura protagonismo a custo fácil, sem que se aperceba (ou até perceba, mas queira fazer-se despercebido) que, por vezes, "a emenda é pior que o soneto".
Senão vejamos:
1. Há três anos atrás o país estava à beira da bancarrota e, mal ou bem, todos percebemos que sem a troika Portugal estaria agora bem pior (a história das duas últimas bancarrotas prova-nos isso);
2. Há três anos que, por via do empréstimo concedido pela troika, o país anda a empobrecer, por forma a reduzir o seu défice orçamental e a cumprir os seus compromissos externos;
3. Quer queiramos, quer não, Portugal vive, pelo menos desde há 40 anos, à custa do financiamento externo, dado o nosso défice orçamental crónico;
4. Nas próximas três décadas continuaremos dependentes dos financiamentos externos, dado a dívida externa que temos para com os nossos credores (que, recorde-se, nos financiaram porque assim lhes pedimos);
5. Faltam dois meses para que o memorando da troika chegue ao fim e possamos recuperar um pouco da nossa autonomia financeira;
6. Sabemos que, mais tarde ou mais cedo, e caso continuemos a cumprir com as exigências dos nossos credores, poderemos tentar a renegociação da nossa dívida pública (as empresas fazem-no quando pedem empréstimos aos bancos, as famílias fazem-no em relação aos créditos concedidos para a compra de casa, pelo que também o Estado o pode fazer);
7. Durante três anos quisemos ser "iguais" à Irlanda e tudo fizemos para nos distanciarmos da Grécia.
Então o que justifica que agora apareça este manifesto? Muito simples: uns apenas estão a fazer aquilo que sempre fizeram (luta político-partidária), enquanto que outros (como Ferreira Leite ou Bagão Félix) aproveitam este manifesto para se mostrarem aos olhos da opinião pública como inocentes e "amigos do povão". Querem dar música ao povão!
Pois bem, se este manifesto se concretizasse, o resultado seria simples: passados poucos meses teríamos um estado insolvente, sem que o financiamento externo surgisse e caso surgisse teríamos que suportar juros enormíssimos. Talvez daqui a uns anos possamos reestruturar a dívida (prolongá-la no tempo), mas falar disso nesta altura é querer fazer politiquice baixa. Não vou na cantiga dessa gente.
Há coisas que se podem pensar, mas há que saber quando as dizemos...