sábado, fevereiro 24, 2007

Nova rede de urgências: uma questão de lógica

Apesar de não ter votado no PS nas últimas eleições legislativas, e portanto estar à vontade para criticar este Governo naquilo que de errado tem feito, a verdade é que penso também ter a capacidade e o bom senso necessários para elogiar o que correctamente tem vindo a ser realizado. Ora, num tempo em que não se pode esbanjar os parcos recursos financeiros que o país tem (imagine-se como será quando se fechar a torneira de Bruxelas em 2013!), não posso estar mais de acordo com a necessidade de se reformularem muitas das redes de serviços e equipamentos sociais existentes em Portugal. O Portugal de 2007 já nada tem que ver com o Portugal de 1985...
Depois das escolas primárias e das maternidades, chegou a vez das urgências. Qualquer pessoa minimamente inteligente perceberá que, com a melhoria verificada ao nível das vias de comunicação nos últimos vinte anos, a noção de distância-tempo sobrepõe-se à de distância quilométrica. Ao mesmo tempo, as áreas de influência dos lugares centrais alargam-se, pelo que deixa de ter qualquer lógica, termos dois ou mais serviços com as mesmas características em locais próximos uns dos outros. Aliás, apenas em jeito de curiosidade, direi que, por estes dias, estou a leccionar esta problemática aos meus alunos de Geografia do 11º ano e nenhum deles discordou da lógica de se racionalizarem correctamente os equipamentos sociais colocados à disposição das populações. Que lógica fará ter um serviço de urgência nocturno aberto durante a noite quando apenas é utilizado por uma média de quatro pessoas, tendo a menos de 30 minutos de distância um outro com as mesmas valências? Nenhuma...
O que há que criticar no Ministro da Saúde e no Primeiro-Ministro é a incapacidade que estes demonstraram para esclarecerem as populações e a falta de humildade que tiveram em não querer falar "abertamente" com os autarcas que representam as populações locais. Em vez disso, o Governo PS avançou com as propostas, assustando e desesperando um povo que, como sabemos, é dominado pela iliteracia...
As vias de comunicação poderão ter muitas vantagens, diminuindo assimetrias e anulando isolamentos, mas também provocam lógicas de concentração, levando inclusivamente, e como bem sabemos, ao desaparecimento de povoações insustentáveis...
Já agora, para quando a reestruturação administrativa do país, nomeadamente ao nível das freguesias?

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Para terminar este debate: o que dizem os mais novos...

Um dos conteúdos programáticos da disciplina de Geografia do 8º ano de escolaridade (também no 10º e 12º anos) prende-se com a demografia, ou seja, o estudo da população. Ora, no início desta semana comecei a leccionar às minhas três turmas de 8º ano matéria relacionada com as disparidades mundiais existentes ao nível dos índices de natalidade e de fecundidade: regiões do mundo, como a maioria dos países africanos, onde o número médio de filhos por mulher em idade fértil é bastante elevado e outras regiões do mundo desenvolvido onde a falta de nascimentos preocupa (ou deveria preocupar) os governantes.
Claro que me poderão vir dizer que falo de alunos de um concelho do Interior, pertencente ao distrito de Viseu e, portanto, com forte influência religiosa e de mentalidade conservadora. Pouco me importa o contexto social que está na origem deste pensamento. Apenas poderei dizer-vos que me agrada ver como (ainda) há jovens que defendem a vida e não perdoam que o "esquecimento" ou a "distracção" sejam razões invocadas para justificar a interrupção de uma gravidez indesejada...

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

O pós-referendo: mais dúvidas que certezas...

Dos 8 832 628 de portugueses inscritos nos cadernos eleitorais com capacidade para se pronunciarem sobre a questão da "despenalização do aborto até às 10 semanas por opção da mulher em estabelecimento legalmente autorizado" perfizeram o total de 2 238 053 indivíduos aqueles que deram concordância à alteração da lei em vigor. Ou seja, foram pouco mais de 25% os portugueses com mais de 18 anos que deram o seu aval à mudança legislativa a introduzir no Código Penal.
Não coloco em dúvida da vitória do SIM, mas discordo totalmente daquilo a que José Sócrates apelidou de consenso social. Não se verificou nenhum consenso!!! Aliás, a haver vitória clara foi a dos mais de quatro milhões de eleitores que se abstiveram...
Mas, sabendo-se que a lei sobre esta matéria vai ser alterada, convém não esquecermos que as dúvidas e interrogações são bem mais profundas do que as certezas. E, nem os mais acérrimos defensores do SIM conseguem responder às questões que agora nos são colocadas:
1. As investigações e os julgamentos deixarão de acontecer para os abortos realizados com 10 semanas e um dia de gravidez?
3. De onde virão os recursos financeiros para pagar os abortos a realizar, seja no sistema público, seja no sistema privado?
4. Não será legítimo que o dinheiro gasto por cada aborto realizado seja igual ao subsídio a atribuir a cada mulher que decida prosseguir com a sua gravidez até ao fim?
5. Não estaremos perante uma lei que discrimina o pai, visto que este não tem na lei uma alínea que lhe permita impedir a decisão da mãe de aniquilar a vida do seu filho?
6. Estaremos perante um Sistema Nacional de Saúde capaz de dar provimento aos milhares de abortos que lhe vão chegar "ás mãos" ou iremos ter um Estado que subsidia os privados para realizar abortos, sabendo nós que estes últimos têm como objectivo final a maximização do lucro?
7. Finalmente, a maior dúvida de todas, os defensores do NÃO têm ou não legitimidade para exigir a realização de mais um referendo daqui a nove anos, visto que este foi tão vinculativo (ou seja não foi) como o realizado há nove anos atrás? Teremos agora sempre um referendo sobre o aborto por cada década que passe?
Convém não esquecer que apenas 25% dos portugueses com capacidade para votar apoiaram a mudança da lei, pelo que há 75% que, directa ou indirectamente, discordam da liberalização do aborto... E, não há dúvidas que temos um país "partido" ao meio: um Norte e ilhas conservadores e defensores acérrimos da vida, e um Sul que nas palavras de Sócrates é modernista e que vai atrás daquilo que vem do resto da Europa e que, infelizmente, menos convinha "copiar"...

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

A propósito do referendo (6)

A poucas horas do referendo de domingo é chegado o momento da decisão final. Depois de durante algumas semanas ter debatido o tema da despenalização do aborto com muita gente, não só aqui na blogosfera, como em muitos outros locais, fico com a sensação de que a abstenção irá atingir proporções bastante elevadas, quiça superiores a 50% (ainda por cima irá chover no próximo domingo!). Por outro lado, parece-me que aqueles que vão votar já têm a sua decisão tomada há muito tempo. Não nos esqueçamos que esta é uma questão que muito tem que ver com a consciência individual de cada um de nós...
Acredito que, no próximo domingo, os portugueses irão provar que o nosso país continua a estar na vanguarda daqueles que têm respeito pela vida dos mais indefesos. País de brandos costumes? Sim senhor e com muito prazer...
Para a semana cá estaremos para debater o dia seguinte ao referendo. Esperemos que para falar mais de nascimentos do que de abortos!!!

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

A propósito do referendo (5)

Estamos já em pleno período de campanha para o referendo do próximo dia 11 de Fevereiro e, como sempre, as notícias incidem mais sobre as asneiras que se vão dizendo, tanto por protagonistas do SIM como do NÃO, do que pela acção pedagógica e informativa que, ainda assim, se vai fazendo um pouco por todo o país. Quem mais recebe as atenções dos "media" não são aqueles que, de forma ponderada e séria, tentam elucidar a população sobre as consequências do SIM ou do NÃO ganhar, mas sim aqueles que vão dizendo e fazendo verdadeiras asneiras, que comportam atitudes radicais e formas de pensar pouco dadas a ouvir argumentos contrários ao seu.
Mas, afinal o que vamos votar neste referendo? A pergunta em causa, que considero mal elaborada e manifestamente deturpada, enquadra-se na legislação penal em vigor. Ora, interessa saber, desde já, qual a função do código penal. Para além de uma função punitiva, convém alertar os mais distraídos que a legislação penal tem em vista uma função pedagógica e também orientadora do cidadão, por forma a distinguir o BEM do MAL...
Todos os actos e acções que impliquem atitudes maléficas ou fora daquilo que se enquadram, em termos civilizacionais, como apologistas do "bem comum" devem ser alvo de penalização no Código Penal. Quanto à pena em si, a mesma deve ser debatida ao nível do Parlamento: pena de prisão, multa, tarefas em prol da sociedade...
Ora, abortar livremente, quando estão em "jogo" dois seres humanos, sendo que um deles é indefeso, pelo que necessita de uma protecção jurídica acrescida, implica que o Código Penal condena tal acto abortivo. Quanto ao tipo de condenação a efectivar, não é essa a questão que nos é proposta no referendo. Infelizmente...