Pois é, finalmente chegou ao fim aquele que foi tido por muitos como o ano horribilis de Portugal desde 1986 (o ano em que aderimos à então CEE e que nos permitiu deixarmos de ser um país pobre para passarmos a ser um país, digamos, remediado). Este foi, infelizmente, o ano em que se bateram muitos dos recordes que nenhum país quer bater: taxa de desemprego e número de emigrantes.
Os factores desta crise estão mais do que diagnosticados. A austeridade revelou-se o remédio que uns consideraram evitável, enquanto outros o viram como uma inevitabilidade. A dose aplicada é mais do que discutível. Mas, como diz o povo "em casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão". Foi o que se passou com Portugal. Com um país à beira da bancarrota, resultado dos muitos erros governativos cometidos durante os últimos 40 anos de democracia, mas com especial incidência nos últimos 15 anos, tornou-se insustentável a lógica de tapar o défice crónico recorrendo à dívida pública. A troika, como diz o povo, "entrou a matar" e aplicou um remédio que durou três anos, mas que deveria ter sido pensado para o dobro do tempo. O apertar do cinto foi mais que evidente e agora todos desesperamos para que a crise chegue ao fim.
O desemprego atingiu milhares de famílias. Muitas delas viram-se obrigadas a emigrar. Muitos dos imigrantes que por cá estavam resolveram regressar aos seus países de origem. Os portugueses viram-se obrigados a conter-se na hora de gastar dinheiro. Comer fora de casa passou a ser um luxo para muitos e passar férias em casa passou a ser banal para muitas famílias. A escola é dos locais onde as consequências da crise são mais evidentes: com famílias desestruturadas, fruto do desemprego ou da emigração, os mais novos são aqueles que mais se ressentem. A pobreza alastrou a muita gente da classe média.
Mas, seguindo o ditado popular de que "em casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão", tivemos outra consequência da crise em que mergulhámos: o mal-estar social, com cada um a olhar para o seu umbigo. Os idosos dizem-se injustiçados por verem os cortes aplicados nas suas reformas. As famílias com filhos consideram que não é a eles que a crise deve incidir. Os funcionários públicos revoltam-se contra os que trabalham no sector privado, mas o mesmo se passa com estes em relação aos que trabalham para o Estado. Os jovens dizem-se incompreendidos por um país onde o emprego escasseia. Os de meia idade que se confrontam com o desemprego afirmam ter a experiência que os jovens não têm e consideram um erro serem preteridos pelos mais novos. Enfim, temos uma sociedade onde impera a inveja e onde cada classe social (ou etária) apenas olha para si própria.
Será que 2014 vai ser melhor? Seguindo a lógica das fases eleitorais, o "normal" é termos anos mais difíceis na primeira metade das legislaturas e anos mais favorecidos nos finais de mandato. Os economistas, seguidores dos que as estatísticas dizem, consideram que a crise está a chegar ao fim. Dizem que o país começa a ter crescimento económico e que o desemprego começou a diminuir. Mas, basta pensar na emigração para perceber que, por enquanto, não há certezas disso. O que parece mais do que certo é o definhamento de Portugal: a natalidade nunca foi tão reduzida e parece que não voltará aos valores de há uns anos atrás. Por outro lado, com o envelhecimento da população portuguesa, o futuro daqueles que agora trabalham e (ainda) esperam vir ter direito a uma reforma digna é cada vez mais duvidoso. E, com esta dúvida, muitos são aqueles que optam por não ter filhos ou ter apenas um. A consequência é mais do que evidente: um país onde o actual sistema de Segurança Social em vigor se torna inviável.
Há pois que esperar que 2014 seja o ano do volte-face e que, com o fim da crise, se concretizem algumas das reformas de que o país realmente necessita: um sistema fiscal que discrimine positivamente as famílias com filhos; um sistema de saúde que evite desperdícios; um sistema de educação que favoreça a equidade e evite o sucesso encapotado; uma reforma do poder autárquico que extinga com concelhos que, hoje em dia, não têm razão de existir e ponha travão aos caciquismos locais; uma reforma do poder político que acabe com muitos dos privilégios que existem para os políticos. E, já agora, que de uma vez por todas possamos ter um país que saiba gerir bem os dinheiros públicos, por forma a acabar com os anos de défice público que nos trouxeram aos estado a que chegámos.
Boas festas e que 2014 seja, dentro das expectativas de cada um, o melhor possível. Que daqui a um ano possamos sorrir. Será bom sinal...