segunda-feira, setembro 17, 2012

Urge reflectir sobre o Portugal que teremos em 2030

Num tempo em que a maioria dos portugueses apenas pensa no presente, esquecendo o passado (as mais recentes manifestações provam que as pessoas já se esqueceram de quais os motivos que levaram a que Portugal esteja hoje dependente dos seus credores externos, ou seja, da troika) e ignorando o futuro que nos aguarda (não percebem ou não querem perceber o estado demográfico do país e as as suas consequências no futuro), é bom que se reflicta um pouco sobre a demografia de Portugal. Aliás, desde que tenho este blogue (já lá vão quase 10 anos!), já por diversas vezes escrevi aqui no blogue sobre este assunto.
Pois bem, este fim-de-semana realizou-se um importante colóquio, de seu nome "Presente no Futuro", organizado pela Fudação Francisco Manuel dos Santos e que contou com muitos entendidos sobre o tema da Demografia. O encontro esteve acessível a todos os que quiseram assistir através da Internet.
Parece, pois, mais que óbvio que a "bomba demográfica" que nos espera fará com que o Estado Social, tal e qual como o conhecemos hoje, não possa existir em 2030. A razão é muito simples: com uma pirâmide etária quase invertida, com uma clara tendência de duplo envelhecimento (na base e no topo), o Estado não terá dinheiro suficiente (proveniente das contribuições sociais para a Segurança Social e dos impostos) para as despesas que então terá em termos de reformas, pensões, subsídios e garantia do Estado Social nos mesmos moldes do que hoje temos.
A maioria da população portuguesa parece não entender esta questão. Urge que os políticos a entendam e sejam frontais com a população, explicando a necessidade de se reformar o Estado Social. Honra seja feita a Bagão Félix que me pareceu ser o único político que, em tempos, tentou alterar radicamente o estado de coisas nesta matéria... Penso que este governo não tem tido uma atitude imobilista perante as dificuldades demográficas que nos esperam no futuro, mas há que ser muito mais concreto nas medidas a aplicar. Claro que o "zé povinho" não quer que lhe mexam nos chamados (mas ilusórios) "direitos adquiridos", mas nada pode ficar na mesma.
Há muito que defendo a necessidade de uma discriminação muito mais positiva em termos de favorecer aqueles que contribuem para a sustentabilidade demográfica do país: as famílias que têm dois ou mais filhos devem ser muito mais beneficiadas, em termos de IRS e de outros apoios, do que as que não têm filhos ou apenas têm um. Claro que ninguém é obrigado a casar ou a ter filhos, mas a diferenciação fiscal deveria ser muito mais incisiva do que a que temos actualmente.
Os políticos que nos têm governado ao longo dos últimos vinte anos parecem não ter compreendido ainda os perigos de não se aplicarem medidas verdadeiramente válidas (as que temos tido aplicadas por este Governo nesta matéria são ainda muito suaves) ao nível da diferenciação fiscal para com as famílias que têm ou não têm filhos... Contudo, quando lecciono esta matéria, os meus alunos compreendem-na na perfeição!
Sejamos claros: em 2030, não haverá recursos para pagar reformas aos vários milhões de reformados que iremos ter. A população activa que agora tem menos de 45 anos será a mais penalizada: são os que agora contribuem para o pagamento das reformas dos actuais idosos, mas sabem (ou deveriam saber) que não têm a certeza de que terão direito à sua reforma nos mesmos moldes actuais. A geração dos nossos filhos, provavelmente, não terá uma vida tão difícil como a que os adultos de agora têm por uma razão muito simples: quando entrarem na vida activa não existirá o regime de contribuições para a Segurança Social que existe actualmente, pelo que poderão livremente fazer os seus próprios planos de poupança-reforma. Por outro lado, a taxa de natalidade é agora tão baixa que a população activa será também mais baixa do que a actual, pelo que a taxa de desemprego até poderá ser menor. Mas, esta possível vantagem tornar-se-á num terrível problema em termos de arranjar recursos para apoiar os muitos idosos de então haverá (que serão os adultos de agora). Aliás, em 2030 voltaremos a ter necessidade de aumentar a nossa imigração, por forma a compensar a falta de jovens.
O gráfico que aqui coloco é bem elucidativo do actual estado de coisas na demografia portuguesa. Basta comparar o Portugal de 1981, quando apenas 28% das famílias não tinham filhos com o Portugal de 2010, em que esse valor se aproximava dos 45%, para perceber que a baixa natalidade é um dado mais que preocupante e que está para ficar por muitos anos...
Pessoalmente, sei que contribuí para o equilíbrio demográfico de Portugal, pois tenho dois filhos. Aliás, seguindo um velho provérbio português, posso sentir-me realizado: tenho dois filhos, já escrevi um livro e já plantei árvores. Seria bom que cada um de nós reflectisse sobre esta questão...

17 comentários:

Anónimo disse...

Que não tenham que emigrar para plantar as suas próprias árvores, é, com a maior sinceridade que o digo, o que mais lhes desejo!

A continuar assim, terá que viajar de avião para ver os seus netos... o que não o amofina muito, já que gosta tanto de tudo o que diz o leporídeo...

Júlio disse...

Artigo elucidativo e com bons pontos de vista. Devia ser de leitura obrigatório para os nossos políticos.

Tiago Fiadeiro disse...

Concordo consigo. Também sou pai e a verdade é que neste país as famílias com filhos pouco beneficiadas são por isso em relação às que não têm filhos.
Portugal nunca teve uma política séria de incentivo à natalidade e agora começamos a ficar preocupados com o futuro que nos está reservado.
A ideia de Estado Social está mesmo posta em causa.

Anónimo disse...

Mas isso tem algum jeito? Você quer obrigar toda a gente a ter filhos? Deve pensar como no tempo do Salazar, só poder ser!

Nan disse...

O desemprego está em níveis altíssimos. O desemprego dos jovens está em níveis estratosféricos. Como é que vamos «ter que aumentar a imigração»? Os imigrantes estão a ir embora, não há trabalho em Portugal. Aliás, há cada vez menos trabalho, é preciso cada vez menos esforço para produzir cada vez mais. O problema da segurança social não é a natalidade, +e o facto de ela continuar a financiar-se tendo em conta o número de trabalhadores e não o valor do que é produzido.

Pedro disse...

Nan,
eu explico-lhe como é que vamos ter a necessidade de aumentar a imigração.
Daqui a uma geração (mais ou menos 30 anos), a população idosa vai ter um peso enorme na sociedade, dado o prolongamento da esperança média de vida. Contudo, a população activa (aquela que terá idade para trabalhar) vai ser mais reduzida do que a actual (dada a quebra da natalidade que se verifica agora), mas terá maiores qualificações. Ora, com a extrema necessidade de mão-de-obra ao nível dos serviços banais e pouco qualificados que existirá daqui a 20 anos, não vamos ter mão-de-obra disponível para esses trabalhos, pelo que serão os imigrantes a "pegar" nessas ocupações.
Por isso, todos os estudos dizem que daqui a 20/30 anos, a imigração aumentará novamente em Portugal, dada a falta de mão-de-obra portuguesa disponível para muitos dos serviços disponíveis. Uma situação parecida como a que ocorreu na década de 90...
Por outro lado, a natalidade continuará a níveis baixos, pelo que serão, novamente, os imigrantes a "compensar" a falta de jovens.
Não se iluda: daqui a 20 anos, um dos problemas mais graves será o da falta de mão-de-obra nacional disponível para muitos dos trabalhos que irão recorrer a mão-de-obra menos qualificada (a necessidade de serviços de apoio à terceira idade será imensa)...

Anónimo disse...

Velhos são os trapos

Nan disse...

Talvez, mas ninguém está disposto a fazer passar aos filhos vinte anos de fome e miséria para depois terem emprego não especializado e mal remunerado. A vocações para o martírio escasseiam...
O Pedro, porém, escusa de se preocupar, o seu querido governo, previdente, já está a tratar da solução - http://www.publico.pt/Sociedade/ministerio-autorizado-a-cortar-em-tratamentos-mais-caros-para-cancro-1564780

Pedro disse...

Nan,
quando o argumento utilizado é o da fome e da miséria, dando a entender que não temos formas de evitar essas situações, está-se a fugir ao âmago da questão: com um país à beira da bancarrota, a austeridade é essencial.
Quanto à segunda nota, convém dizer a verdade toda: estamos a falar de um parecer (sim, um parecer e não algo vinculativo) do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida que aconselha que o Ministério da Saúde "pode e deve racionar" o acesso a tratamentos mais caros para pessoas com cancro, sida e doenças reumáticas...

Nan disse...

Boa! Então ensine lá como vamos evitar a fome e a miséria, sem emprego, sem dinheiro, ou com um emprego miseravelmente pago, com os preços a subir, sem direito a saúde ou educação. Já agora, explique também a cristianíssima medida de decidir quem deve ter direito a tratamento e quem deve ser deixado a morrer ou com dores insuportáveis. Qual é a sua sugestão?

Nan disse...

Já agora, leia isto http://entreasbrumasdamemoria.blogspot.pt/2012/10/parece-um-pouco-assustador.html#links e reflicta...

Pedro disse...

Nan, eu não tenho nenhuma varinha mágica. Apenas tento ver a realidade tal como ela é, contextualizando-a ao nível geográfico e temporal. Claro que o ideal seria não haver pobres, nem miséria, nem desemprego. Mas, isso é viver longe da realidade que temos.
Quanto à sua sugestão de leitura, dir-lhe-ei que os problemas da Ásia e da África subsariana nada têm que ver com os problemas da Europa, seja em termos demográficos, sociais ou económicos.
Claro que a Europa tem de fazer muito mais do que tem feito, sobretudo em termos de uma verdadeira união monetária e financeira. Mas, as políticas governamentais não se podem substituir aos que verdadeiramente criam postos de trabalho: os empresários. Os governos podem é criar as condições para tal...

Nan disse...

Claro, esquecia-me de que a África subsariana e a Ásia ficam noutro planeta. Burrice minha. Não temos nada a ver com os problemas deles, claro! Onde é que você estudou Geografia?
Varinhas mágicas ninguém tem. Nem é disso que se fala. Mas que futuro deseja você para os seus filhos?Empregados de limpeza num luxuoso lar de idosos nórdicos? Cortadores de relva num campo de golfe? Designers, pagos em refeições pré-cozinhadas baratas, que concebem produtos de luxo que nunca poderão ter? Seja lá PSD (is adizer social-democrata, mas o PSD não é social-democrata) à vontade, mas não seja cego!

Pedro disse...

Nan,
parece que não percebeu as minhas palavras. Eu não disse que não temos nada que ver com os problemas da Ásia e da África subsariana. Disse sim que os problemas são diferentes. Um exemplo: eles têm taxas de natalidade elevadíssimas, enquanto que nós temos taxas de natalidade preocupantemente baixas. Por isso, peço-lhe que não deturpe as minhas palavras... Termos problemas diferentes dos deles não é o mesmo que dizer que devemos ignorar os problemas deles, visto que também consequências nas nossas vidas, ok?
Quanto ao futuro dos meus filhos, dir-lhe-ei que espero que este governo não faça o que os anteriores fizeram durante os últimos 15 anos, em que vivemos acima das nossas possibilidades e gastámos dinheiro em obras sem utilidade, colocando em causa as gerações futuras. Numa expressão: espero que tenhamos os pés bem assentes na terra e caminhemos rumo a um desenvolvimento sustentável...
Se para isso tivermos agora que "empobrecer" e mudar alguns dos nossos hábitos, não me importo. Desde que seja para temos um melhor futuro.
Espero que tenha sido esclarecedor.

Nan disse...

Extremamente esclarecedor. Já percebi que é completamente cego e surdo, daquela espécie que só vê o ouve o que quer. Você acredita mesmo que a gente que nos desgoverna está bem intencionadamente a proteger o seu futuro e o dos seus filhos. Bom, pelo menos dorme descansado por enquanto, mas calculo que se encaminha para um grande choque. Se eu estiver enganada, melhor...

Pedro disse...

Choque maior do que aquele que tive quando o povo português voltou a dar a segunda vitória ao incompetente Sócrates quando este já estava a dar cabo do país, de certeza não terei. E não me esqueço que a Ferreira Leite avisou os eleitores do que estavam a fazer ao darem novo mandato ao maior incompetente que passou pela política portuguesa.
Eu tenho a consciência tranquila, pois não contribuí para o socratismo que tivemos.
Agora estamos a ter os sacrifícos que merecemos pelo facto de Sócrates ter levado o país quase à bancarrota. Ainda não percebeu que estivémos a um pequeno passo da falência do país?

Nan disse...

Estou à beira das lágrimas. Você é um caso perdido, mas comovente... Desisto.