domingo, dezembro 09, 2012

Uma reforma político-administrativa (ainda) incompleta...

Uma das medidas constantes no memorando de entendimento com a troika assinado pelos partidos do arco da governação é o da reforma do aparelho administrativo do país, nomeadamente em termos de fusão e extinção de freguesias e de municípios.
Já aqui escrevi aqui várias vezes sobre este assunto, mesmo antes de entrar por cá a troika e se falar na necessidade de se reformar o aparelho administrativo do país. Qualquer pessoa minimamente entendida em geografia percebe que a existência de municípios e de freguesas está dependente de, pelo menos, dois factores: a qualidade e diversidade das vias de comunicação existentes e a realidade demográfica local. 
Ora, já no início do século XIX, Mouzinho da Silveira tinha percebido que Portugal havia evoluído em relação ao que o país era no século XVI e decidiu-se por extinguir centenas de munícios pelo país fora. Também nesse tempo foi alvo de grande contestação popular, mas a História veio dar-lhe razão mais tarde. 
Situação semelhante vive-se agora. Este governo foi alvo de muitas manifestações populares contra a política de fusão de muitas freguesias. Ora, o povo apenas olha para o seu umbigo e (ainda) não percebe que a melhorias das vias de comunicação, sobretudo rodoviárias, aproxima os lugares em termos de distância-tempo. Aliás, hoje em dia já não faz qualquer sentido falar-se em termos de distâncias quilométricas, dadas as melhorias verificadas nas deslocações. Por outro lado, muitos lugares que tinham milhares de habitantes, situação que esteve na origem da criação de freguesias, não têm hoje mais do que algumas centenas ou mesmo dezenas de habitantes, o que justifica que não se mantenha a existência de uma freguesia, quando a poucos minutos de distância existe outra freguesia nas mesmas condições. Neste caso, a política de agregação faz todo o sentido.
Por um lado, considero que se poderia ter ido muito mais além na extinção de freguesias urbanas. Se tem lógica que se agreguem freguesias rurais que distam apenas alguns minutos umas das outras, o mesmo deveria ter ocorrido ao nível das freguesias urbanas, até porque nestes casos muitas das competências sobrepõem-se à escala da sede de concelho. Neste caso, faria todo o sentido agregar muitas mais freguesias localizadas nas sedes dos municípios.
Por outro lado, pouco se fez em termos de agregação de concelhos. Há a possibilidade de se poderem agregar por sua vontade, mas todos sabemos que o caciquismo impede que isso se concretize, pelo que as "ordens" terão que vir emanadas do poder central. Claro que esta agregação de concelhos terá que ter por base estudos científicos que provem que os ganhos em termos de distância-tempo entre concelhos e a escala demográfica justificam que se agreguem concelhos. Dou apenas um exemplo que conheço bem, de muitos que existem por este país fora: o concelho de Belmonte. Este concelho, de reduzidas dimensões, tanto de superfície, como de população, localiza-se entre os concelhos a Guarda e de Covilhã. Grande parte da população deste concelho trabalha nestes dois concelhos vizinhos, pelo que as migrações pendulares inter-concelhias são uma realidade muito forte em Belmonte. Tendo em conta estes factores, considero que faria todo o sentido agregar o concelho de Belmonte ao da Covilhã ou da Guarda, ou mesmo, "reparti-lo" pelos dois. Situação semelhante ocorre, mas aqui por iniciativa própria, entre os concelhos da Covilhã e do Fundão, onde ambos os autarcas já avançaram com tal possibilidade. O mesmo se falou para as cidades do Porto e de Gaia. Mas há muitos mais exemplos, de norte a sul do país.
Claro que esta é uma reforma impopular, mas Mouzinho da Silveira também avançou com um reforma que, já no seu tempo era alvo de críticas. Daqui a uns meses teremos as eleições autárquicas, mas espera-se que daqui a um ano se avance, sem medos e sem rodeios, para uma necessária e urgente reforma dos concelhos de Portugal, tendo por base critérios científicos e que poderão levar à poupança de muitos milhões de euros e de milhares de cargos políticos e afins que apenas servem de despesa ao Estado e, portanto, aos contribuintes.

8 comentários:

Gorgi disse...

Isso é que é falar com conhecimento de causa.
Olha, por aqui também vão juntar umas quantas freguesias.
E olha que também podiam juntar alguns munícipios que eu não me chateava nada. A Régua e Santa Marta de Penaguião ficam tão próximas que bem podiam juntá-las.
Abraço

Anónimo disse...

E o que me diz da criação de cargos políticos nas comunidades intermunicipais com remunerações de 4000 euros por mês?
Corta-se de um lado, mas inventa-se do outro para os boys do partido, não é?
Vá, diga lá qualquer coisinha sobre isto.

danieltecelao disse...

Com que então o povo olha para o seu umbigo.Não são os corruptos, ladrões e canalhas dos politicos que levaram o país ao estado actual.
Com gente desta não admira as elites que o país tem!!!

Anónimo disse...

Pedro, Pedro, deixe lá o povo em paz! Volto a lembrar-lhe que você conhece apenas uma ínfima parte da realidade e não pode julgar o todo por ela. Há muitos pequenos lugares em que a Junta de Freguesia é a única coisa que ainda não foi tirada às pessoas. Já lhes fecharam a escola, o centro de saúde, os correios... já só têm a Junta para contactarem com o mundo, para lhes resolver os pequenos problemas do dia-a-dia. Se haverá certamente lugares em que isso pouca diferença fará, outros existem em que fechar a Junta equivale a deixar as pessoas numa ilha de isolamento. Há pequenas terras com rivalidades terríveis e seculares entre frequesias e mexer aí é mexer num vespeiro, tem que ser feito com pinças e muito cuidado. Lembre-se ainda de que uma deslocação que a si lhe parece fácil de carro, pode ser intransponível para alguém com 80 anos, falta de vista, mobilidade reduzida e reforma ainda mais reduzida, e dependente de um autocarro de manhã e outro ao fim da tarde, quando os há. Não pode valer tudo!
Francisco

Anónimo disse...

Pedro, «poderá haver» e «despesas supérfluas», por favor. E não me acuse de paternalismo, reveja.

Pedro disse...

Caro anónimo, sobre aquilo que diz, li que se vão cortar quase 700 cargos e que se criam 37 novos cargos executivos nas comunidades intermunicipais. Ora, não tendo nós regionalização, penso que o intermunicipalismo constitui factor decisivo na gestão de equipamentos e variados serviços de âmbito intermunicipal.
Pelo que li a remuneração andará à volta de 3000 euros (penso que ilíquidos), o que para um cargo destes será aceitável. O que se poderá chamar a atenção é a forma como estes cargos vão ser preenchidos: por nomeação ou eleição?

Caro Francisco, concordo consigo: cada caso é um caso e, de facto, poderá haver situações em que a extinção da freguesia poderá penalizar os mais idosos. Mas, nos dias que correm não podemos ter tudo perto de casa. Daí que as autarquias devam preocupar-se mais com os mais idosos e menos com despesas supérfluas (rotundas, estradas e outras obras de betão).

Pedro disse...

Caro anónimo(?), está revisto. Obrigado.

Anónimo disse...

Pois... acabam-se com os presidentes de junta, que na esmagadora maioria desempenham os seus cargos por amor à camisola e auferindo um «vencimento» ridículo, mas criam-se jobs for the boys e parece-lhe aceitável!!!!

Se é assim tão aceitável, explique-me por é que nenhum autarca (câmaras municipais) vêem nenhum sentido nisto?