domingo, outubro 21, 2012

Os juízes querem governar? Haja paciência...

A Associação Sindical dos Juízes Portugueses veio afirmar que o Orçamento de Estado para 2013 é inconstitucional porque apresenta “um desmesurado e brutal aumento da carga fiscal dos portugueses". Na opinião desta corporação profissional até parece que a Constituição não permite que haja lugar a aumentos da carga fiscal, pelo que o Orçamento teria que ser outro. Caso contrário, é inconstitucional.
Não sendo formado em Direito, mas depois de me informar sobre a questão suscitada pelos juízes, parece-me que estamos na presença de uma atitude de manifesta má-fé e abuso de interpretação do que dita a nossa Constituição. Aliás, tudo isto me parece indiciar quase que um gesto de vingança dos juízes portugueses, pelo facto de verem o Governo "mexer" nos seus direitos que, porventura, consideravam sagrados e imutáveis. É que convém alertar para o facto de também os juízes terem sido alvo de congelamentos dos salários e das progressão nas carreiras, do corte de subsídios e de outras regalias, o que levou esta classe profissional a sentir-se afrontada pelo poder político...
Ora, esta atitude dos juízes apenas se compreende no âmbito de uma espécie de auto-governamentalização do poder judicial, até porque "julgar" em causa própria é algo de imoral e eticamente reprovável. Já não bastava termos a rua a querer governar o país; agora são os senhores juízes a quererem dizer como se gere a carga fiscal de um país.
Mas, também o "pai" da nossa Constituição se quis meter na conversa e apresenta uma argumentação de bradar aos céus. Afirma Jorge Miranda que a diminuição de oito para cinco escalões viola a Constituição. A solução preconizada por este constitucionalista seria o aumento do número de escalões para, assim, diminuir a carga aos que têm menos rendimentos e aumentar aos que auferem maiores rendimentos. Jorge Miranda tem a obrigação de saber que os aumentos ou diminuições da carga fiscal devem ser vistos do em termos de valores absolutos e não a nível percentual. É claro que se alguém da classe média-baixa pagava 50 euros de IRS e agora passa a pagar 75 euros, vai ter um aumento de 50% na carga fiscal (embora o aumento real seja de 25 euros). Já alguém da classe média que pagava 2500 euros de IRS e passa agora a pagar 3000 euros apresenta um aumento da sua carga fiscal em "apenas" 20%, mas em termos brutos vai contribuir muito mais (aumento de 500 euros) do que aquele que vai pagar mais 25 euros. Portanto, tudo depende da forma como se apresentam os números.
Aliás, a maior critica que se pode fazer a Jorge Miranda é a de ter "pensado" uma Constituição que mais serve de impasse e travão a uma governação audaz e eficaz! Basta comparar a nossa Constituição com a dos EUA para perceber que, se fossemos ao pormenor da lei (pura e dura) quase tudo o que se faz em termos de governação seria dado como inconstitucional, tal é a profusão de artigos que a nossa CRP tem. Enfim, temos uma Constituição que funciona como um verdadeiro colete de forças que impede uma governação plena e adaptada ao século XXI.
Voltando ao início da questão, deixo aqui as palavras de Paulo Rangel, nas quais me revejo: "os juízes, que são terceiros por natureza, não devem apresentar-se nem constituir-se como partes. Ao vestirem, formal ou materialmente, a pele de parte, põem em perigo a independência ou a imagem de independência dos seus pares que hão-de presidir a um eventual julgamento".
Agora só faltava mesmo vermos o Tribunal Constitucional vir dizer que as alterações ao IRS são inconstitucionais. Seria o mesmo que dizer aos juízes para serem eles a governar o país.
Que se mude rapidamente a actual Constituição, sob pena de ficarmos "emperrados" no século XX...
Resta dizer que para se ver ao estado a que o país chegou em termos de "degradação" do poder judicial, agora até os juízes e os magistrados do Ministério Público ameaçam com a greve. E ainda temos os polícias a quererem fazer manifestações e os militares fardados a marcarem concentrações. Os governos anteriores deram-lhes tantos direitos que agora temos o que temos: o corporativismo sindical a impor-se à dignidade profissional de algumas das profissões essenciais ao Estado de Direito de um país...

11 comentários:

Nan disse...

Sem Constituição é que estávamos bem, não era? Que tristeza! E, já agora, Ai não leva acento!

Pedro disse...

Nan, a mania de deturpar aquilo que os outros dizem é próprio das pessoas que têm dificuldade em argumentar.
Eu falei em mudar-se a Constituição. Não em acabar com ela!!!
Urge tornar a nossa Constituição mais simples, mais perceptível do grande público e, já agora, que não dificulte o desenvolvimento do país...
Estamos no século XXI, pelo que já não faz sentido termos uma lei geral do século passado.

Afonso disse...

Acho muito bem que os juizes façam greve. E que os policias e os militares se manifestem. E que os médicos, enfermeiros e professores protestem.
Que a Merkel seja recebida com o país a protestar. Que todo o país pare dia 14 de Novembro. Este governo tem de cair. Não há outra solução. O Otelo é que tem razão. É preciso uma nova revolução.

Nan disse...

«Estamos no século XXI, pelo que já não faz sentido termos uma lei geral do século passado.» Este deve ser o argumento mais parvo que já vi. Você e eu também nascemos no século passado - estaremos obsoletos? A Constituição está publicada e vende-se nas livrarias, só não a conhece que, não quer. Há edições anotadas,até há edições dirigidas às crianças... O que é que você quer mudar na constituição, exactamente? Ou é só porque emprenha pelos ouvidinhos?

Pedro disse...

Nan, ambos nascemos no século XX, mas não pensamos, nem agimos como há trinta ou quarenta anos atrás. Tudo evolui. Até você, porventura sem se fazr conta disso...
Por isso, há que adaptar a Constituição aos tempos de hoje. Desde logo, alterando o seu preâmbulo, quando se afirma que se pretende "abrir caminho para uma sociedade socialista". Depois de um regime ditatorial ainda se compreendia este palavriado, mas nos dias de hoje já não faz sentido...
Mas, dou-lhe outro exemplo de como a Constituição é bonita no papel, mas difícil ou mesmo quase impossível de se efectivar em muitos dos seus artigos.
Quando se diz no nº 1 do artigo 20º que "a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais (...) não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos", a verdade é que todos os dias isto não é cumprido quando se pagam custas judiciais para se ter direito à justiça, ou quando se diz no artigo 24º que a "vida é inviolável" e temos o aborto livre até às 10 semanas de gravidez, ou quando no artigo 64º se diz que o acesso à saúde é "tendencialmente gratuito", coisa que é impossível de ser concretizável.
Enfim, das duas uma: ou se altera a Constituição para que se adapte à realidade dos dias de hoje (a dos EUA só tem sete artigos, mais algumas emendas) ou continuamos com uma Constituição que não passa do "faz de conta" com artigos muito lindos na teoria, mas muitos deles impossíveis de serem concretizáveis nos dias de hoje (a questão da gratuitidade é mais que evidente).
Prefiro uma Constituição curta, perceptível, susceptível de ser respeitada e levada à prática do que um punhado de intenções, muitos deles mera teoria...

Varandas disse...

Os juízes não passam de uma cambada de corruptos que julgam ter o rei na barriga. Pensam ser uns intocáveis e agora até vão julgar em causa própria.
Alguém sabe de algum juíz que tenha sido condenado por algum crime?
O que vamos ter agora é o país em suspense à espera da decisão destes tipos. E como lhes foram ao bolso vão-se vingar.
Políticos, advogados e juízes não passam de uma cambada de corruptos: nenhum deles foi para a prisão até agora.

Helena disse...

Pedro, acredito que os juizes do Tribunal Constitucional saibam decidir em consciência. Contudo, parece-me um risco que qualquer medida tomada por este ou outro Governo possa ter de voltar atrás pela decisão de uns quantos juizes que parecem ser os donos da verdade. E isto quando temos gente entendida na matéria que tem oponiões totalmente diferentes. Jorge Miranda diz uma coisa, enquanto que Marcelo Rebelo de Sousa diz o seu contrário. Portanto, aqui não há verdades absolutas como alguns dão a entender.
O que recentemente aconteceu na Itália sobre a condenação de sismólogos e cientistas sobre a não previsão de um sismo torna evidente o risco de tudo se decidir nos tribunais.

uma leitora umbiguista disse...

Esta é demais!
Então o Tribunal Constitucional serve para quê? Você tem medo da decisão dos juizes? Ou pensa que isto é uma ditadura?
Se há uma Constituição em vigor que se respeitem as leis.
O que está mal é o orçamento, não é a Consituição.
Seja democrata e respeite a lei. Deixe lá a partidarite.

Pedro disse...

Outra vez a leitora do Umbigo!!!
Será que há algum problema em considerar que Portugal necessita de uma revisão constitucional? É a minha opinião. E já disse porquê.
Em relação aos juízes apenas refiro que discordo da atitude do sindicato dos juízes em tomar partido numa questão em que são parte interessada.
De resto, penso que esta proposta de Orçamento de Estado não vai contra o postulado na nossa Constituição. E também já escrevi as razões que me levam a ter esta opinião. É que não basta criticar por criticar...
Em relação ao comentário do Varandas direi que não gosto de por rótulos em classes profissionais. Há bons e maus profissionais em todo o lado.
Quanto à Helena considero a sua referência ao caso italiano bastante pertinente. Demonstra muito bem os perigos da Justiça querer ser justiceira em relação a tudo.

Tiago Fiadeiro disse...

É verdade, precisamos urgentemente de uma revisão constitucional. O Portugal de hoje nada tem que ver com aquilo que surgiu logo após a revolução de Novembro de 1975. Sim, porque se temos democracia é porque depois de Abril de 74 tivemos um 25 de Novembro que tirou o país de uma ditadura comunista.

Anónimo disse...

Este país e a merda de mania dos vinte e cinco...

Estamos cagados!

No mínimo, com muita sorte, só lá para vinte e cinco de Dezembro de 2025 é que isto começa a melhorar um bocadinho!