Fui ontem assitir a uma conferência que tinha como tema "Estará a desertificação a ameaçar a identidade beirã?", realizada no âmbito do ciclo de conferências "Olhares Cruzados Sobre Viseu", promovido pelo Público e pela Câmara Municipal de Viseu. O debate teve como conferencistas o fotógrafo Homem Cardoso e o antropólogo João Pereira Neto. Certamente que os impulsionadores deste ciclo de debates tiveram como fundamento para convidar estes interlocutores os objectivos de dar a conhecer a visão de alguém que, como fotógrafo e artista da imagem, poderia abordar a evolução da paisagem beirã, assim como a visão de um estudioso das relações humanas, que poderia evidenciar algumas especificidades culturais que o beirão poderá ou não ter.
A verdade é que o dito debate foi, quanto a mim, uma completa desilusão. Por um lado, Pereira Neto fez uma abordagem, mais da identidade portuguesa do que propriamente do ser-se beirão, tendo extrapolado uma sua experiência pessoal para elogiar de forma simpática a identidade beirã. Por outro lado, Homem Cardoso revelou-se uma competa "seca", tendo estado durante quase uma hora a contar histórias da sua vida pessoal, como se isso contribuísse em alguma coisa para o tema em questão. É o que dá quando se convidam figuras que pouco sabem do que realmente é o sentimento beirão...
Como beirão que sou senti-me completamente defraudado com a dita conferência... E, o que é isto de ser-se beirão? Muito simples... É o sentimento de pertença a um território com o qual as afinidades são enormes. Tal como o alentejano tem orgulho em pertencer ao Alentejo e o minhoto ao Minho, o beirão identifica-se, por completo, com a Beira. Especificidades de ser-se beirão? Sinceramente, tirando a legítima pertença territorial, não vejo nenhuma em especial... Vir dizer que é mais trabalhador ou mais bruto não tem, quanto a mim, nenhuma lógica... Quanto à questão da desertificação (noção utilizada de forma errada para o processo de despovoamento humano), esta é uma realidade que afecta, sobretudo, as aldeias e o mundo rural em geral e não, propriamente, cidades de média dimensão, como Viseu, Covilhã ou Guarda. Estas têm conseguido suster a migração para o litoral, com base na diversificação dos sectores económicos, mas também (infelizmente) graças à captação de população que vivia nas aldeias circundantes.
Contudo, penso que a identidade beirã não está em risco de sucumbir. O grande risco está, sobretudo, no abandono do meio rural e na perda das tradições e costumes mais antigos que caracterizavam o beirão. Mas, esta é uma realidade que afecta todo o país e para a qual a solução está, por exemplo, no impulsionamento das aldeias históricas e na concretrização de medidas que visem defender a cultura tradicional das diversas regiões portuguesas.
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